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Natal: Família ou consumismo?

13 de Dezembro, 2024

E está aí o Natal, a época preferida do ano para muitos pequenos e graúdos. O tempo quente do verão já lá vai, o inverno está aí e, com ele, as lareiras acesas e as mantas no sofá. Parece que o tempo para, que os problemas desaparecem e só ouvimos falar em amor, partilha e solidariedade mesmo em locais e situações onde esses conceitos estão praticamente omissos durante o resto do ano. A azáfama é muita e os shoppings ficam cheios porque todos temos uma longa lista de presentes que temos de comprar. Sucedem-se os jantares de Natal de empresas, com amigos, com conhecidos, com grupos de atividades que praticamos de forma recreativa e os fins de semana parecem não ser suficientes para tantas trocas de prendas. Contudo, como pode a realidade da partilha da solidariedade e do amor conviver com este consumismo desenfreado que cada vez mais é uma certeza? As pessoas atropelam-se e guerreiam quando uma qualquer cadeia de hipermercados faz uma campanha de desconto sobre os brinquedos. Esquecem o amor, a partilha e a solidariedade e fazem de tudo para conseguir este ou aquele brinquedo que o/a filho/a tanto quer e que, passadas algumas horas, já esqueceu uma vez passado o Natal. Assim, vale a pena perguntar: o Natal continua a representar a família ou está suportado cada vez mais no consumismo?

Tempos houve, na minha infância, em que os brinquedos eram um luxo. De nada servia escrever uma carta ao pai natal, já que os parcos recursos financeiros da família não se coadunavam com este ou aquele brinquedo da moda nesse ano. Os avós, salvação para muitas das crianças da atualidade, já que oferecem, muitas vezes, aquilo que os pais não querem dar, também não eram uma solução. No meu tempo, por norma, recebia dos avós as tradicionais e clássicas meias, ou então, as célebres camisolas interiores brancas que levava para a escola por baixo das outras seis camisolas que a minha mãe me obrigava a vestir. Não precisava de ter funcionalidade nos braços, o importante é que não passava frio. Apesar dos brinquedos serem uma raridade, a verdade é que as melhores recordações que tenho do Natal continuam a pertencer à minha infância. A mesa cheia, a família toda reunida, a confusão instalada e os sorrisos constantes. Partilhávamos experiências, conversas e muito amor. O meu Natal era certamente diferente até porque o meu avô fazia anos, precisamente, no dia de Natal, assim além do Menino Jesus, cantávamos-lhe sempre os parabéns. No almoço, no dia 25, aproveitámos para mostrar aos primos os presentes recebidos que começávamos de imediato a usar (e a estragar) para desespero dos pais. Algumas peças já não sobreviviam e esse dia e lá continuávamos com a boneca, o resto do ano, sem um olho ou com o cabelo cortado, uma vez que decidimos fingir que éramos cabeleiras, sem reconhecer que, ao contrário do que acontece com os humanos, nas bonecas, o cabelo cortado não volta a crescer. 

Também nunca podia faltar o presépio, construído com dezenas de peças cuidadosamente distribuídas de forma artística pelo monte de musgo que o pai recolhia dias antes no monte. O pinheiro era trazido também desse mesmo monte e aguentava-se estoicamente viçoso até finais de janeiro quando o presépio era desfeito. Para imitar neve usávamos farinha que salpicava o verde. O maior desafio era mesmo o estábulo, uma vez que detínhamos apenas as figuras. Assim, todos os anos, o meu pai dava uma de arquiteto e, com recurso a uns tijolos e bocados de tábuas, construída o abrigo onde as pequenas figuras eram colocadas como manda a tradição. O entusiasmo era grande para a sua construção. Já no que diz respeito à sua dissolução não podíamos dizer o mesmo… 

Os anos passam, a realidade muda e, com ela, as tradições de Natal. Crescemos, construímos a nossa própria família e a consoada passa a ser feita de outras experiências e outros sons. Nascem os filhos e passam a ser eles as estrelas da festa. Esquecem-se as camisolas interiores (já ninguem as usa) e as prioridades invertem-se. Agora o mais importante é adquirir este aquele brinquedo da moda, fazer esta ou aquela encomenda na internet, com timing suficiente para que chegue antes do Natal. 

Apesar da realidade ser muito diferente na atualidade, há uma figura que se mantém: o Pai Natal. Normalmente conhecido pelo seu fato vermelho, barbas brancas este simpático avozinho, na véspera de Natal desce a chaminé de cada casa para entregar presentes às crianças bem-comportadas. A questão é que muitos não sabem que a imagem que temos desta figura bonacheirona que trabalha apenas alguns dias no ano e que consegue o milagre de dar a volta ao mundo em apenas 24 horas, num trenó puxado por renas que voam foi criado por uma conhecida marca de refrigerantes. Ainda que seja inspirado em São Nicolau, nascido nos finais do século III, arcebispo de Mira, na Turquia, conhecido por ajudar os mais necessitados oferecendo-lhes dinheiro anonimamente, a transformação do arcebispo para o Pai Natal surgiu na Alemanha. Ainda assim, só quando, em 1931, a Coca-Cola decidiu usar a figura do velhinho vestido de vermelho e com barbas brancas numa das suas publicidades, é que este se tornou uma lenda mundial.

“O Pai Natal apareceu pela primeira vez num anúncio da Coca-Cola em 1920, numa ilustração publicada no The Saturday Evening Post. Porém, o Pai Natal tal como o conhecemos surgiu em 1931 pela mão do cartoonista Haddon Sundblom, a pedido da D’Arcy, agência de publicidade da Coca‑Cola. O objetivo era criar uma personagem entre o simbólico e o real, a personificação do espírito natalício e a felicidade da Coca‑Cola. Para isso, o ilustrador inspirou-se no poema “A Visit From St. Nicholas”, de Clement Clark Moore” e na figura do seu amigo Lou Prentiss, vendedor reformado. A campanha tinha como objetivo aumentar as vendas desta popular bebida durante o inverno, daí que fosse necessária a criação de uma figura gorducha, risonha, com bochechas vermelhas e ar bonacheirão, irradiando simpatia, suscetível de atrair, de forma automática e espontânea adultos e crianças, convencendo-os a beber este refrigerante, mesmo durante o frio do Inverno.

Muito se discute também se devemos continuar a alimentar esta ideia deste ícone, em prejuízo de defender que é o Menino Jesus que oferece os presentes. Seja de que forma for, é inegável também que a existência do Pai Natal, nos faz sonhar e nos leva a acreditar na magia e no impossível durante os nossos primeiros anos de vida. Acreditámos que tudo é possível e que o bem compensa, uma vez que apenas os meninos mais bem-comportados recebem os seus presentes. Acreditámos que os sonhos valem a pena e que podem ser concretizados se trabalharmos nesse sentido. Acreditámos no amanhã e no futuro, já que aguardamos, com expetativa a manhã do dia 25 de dezembro, o que faz com que aprendamos também a saber esperar e a sermos pacientes. Assim, “vender” a ideia de um qualquer ser que nos recompensa quando nos portámos bem é positiva e oferece-nos importantes ferramentas que podemos explorar quando adultos.

O problema está, como em tudo na vida, no exagero, e na concretização de fins sem olharmos a meios. Assim, sejamos regrados nas nossas escolhas e saibamos valorizar a importância das coisas e do trabalho. Ofereçamos presentes e mimos, mas apenas os necessários para manter viva a chama do sonho. Não banalizemos o sentimento da esperança e o poder da partilha e, de facto, conservamos apenas o essencial para a nossa vida. Partilhemos com quem menos tem, aquilo que temos em excesso não apenas no Natal, mas durante todo o ano, uma vez que essa necessidade existe nos restantes 363 dias do ano. E, sobretudo, sejamos humanistas e empáticos. Convido todos, neste Natal, a sair da sua zona de conforto e esquecer o seu próprio umbigo e a fazer de 2025 um verdadeiro ano de partilha e de solidariedade. Muitas vezes, um sorriso, um abraço, uma palavra amiga podem ser o suficiente para mudar, para melhor, a vida de alguém. Arrisque e ofereça amor!

Por Armanda Bragança

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