Quando mais jovens, todos desejamos fazer rapidamente 18 anos de idade, atingir a maioridade. Quase contamos os dias para a chegada dessa data. Parece que o tempo não passa tão rápido quanto gostaríamos. Pensamos que a nossa vida mudará de um dia para o outro, naquele preciso momento em que o relógio atinge a meia-noite e é o dia em que comemoramos o nosso 18º aniversário. Contudo, nessa data, na verdade, apenas ganhamos dois novos direitos: podemos tirar a carta de condução para veículos ligeiros e podemos exercer o nosso direito de voto. A realidade é que, para além disso, nada muda e sentimo-nos como uma Cinderela, aquando do bater das 12 badaladas e enfrentamos a dura realidade. Continuamos a ter de responder perante os nossos pais, continuamos a não poder fazer aquilo que queremos, não podemos comprar o que queremos e todas as regras e obrigações continuam a existir.
Claro que, mais tarde ou mais cedo, acabamos por efetivamente sair de casa dos nossos pais. A questão é que essa mudança acontece cada vez mais tarde. Os motivos para a mudança desse paradigma são vários, ainda que, desde logo, possamos destacar o elevado preço da habitação no nosso país. Dificilmente um jovem, em início de carreira, consegue suportar o valor de uma renda ou de um empréstimo ao banco. Mesmo quando encontramos a nossa cara-metade e dispomos já de dois ordenados para fazer face a este grande desafio, ainda que o ditado popular diga que quem quer casa, quer casa, são diversos os casos em que a casa dos pais continua a ser a solução mais viável e plausível, durante muito tempo. As despesas são muitas e a vida está cara nosso país: conta da água, conta da luz, conta do telemóvel, conta da televisão e internet, conta do supermercado, conta do combustível, contas e mais contas.
Apesar disso, lá chega o dia em que temos de voar e sair do ninho… Ainda que inúmeras vezes adiada, a decisão acaba por ser inevitável e, um dia, abandonamos aquela que foi a nossa realidade durante toda a nossa vida, o nosso porto seguro. Deixamos as certezas, o conforto e partimos em direção ao desconhecido, ao mundo das responsabilidades e das inúmeras contas para pagar. Temos de começar de novo e escrever a nossa própria história, dando início a um diferente volume daquela que é a enciclopédia da nossa família.
Também não podemos olvidar que cada família é uma família, pelo que não são todas iguais… Todas têm as suas particularidades. Existem as maiores e mais barulhentas, as mais pequenas com apenas um filho cujo pai e mãe também são filhos únicos, aquelas que nunca abdicam de estar juntas ao domingo ou aquelas que se encontram apenas em casamentos, batizados e comunhões e que convivem pacificamente com essa realidade.
Seja qual for o caso, a verdade é que devemos sempre celebrar a nossa família, depois da independência. Em primeira instância, a família é a base da nossa existência. Sem o nosso pai e a nossa mãe não existiríamos. Para queles que têm a sorte de ter irmãos, apesar das muitas zangas, puxões de cabelos, roubo de brinquedos e acusações de culpa perante uma qualquer asneira, a verdade é que, graças a eles, a nossa infância foi rica em experiências e aprendizagens. Aprendemos, desde logo, a partilhar e a viver em comunidade. Aprendemos a negociar e a ter de obedecer aos mais velhos, já que, o irmão mais velho, na ausência dos pais era sempre o responsável por tudo o que de bom ou mau acontecia em casa. No caso do convívio com primos, a vida era ainda mais rica, ainda que mais barulhenta e confusa também. Nunca esquecerei os natais em casa dos meus avós maternos (o meu avô fazia anos no dia de Natal), com as minhas primas. Ainda que continue a adorar o Natal, a verdade é que nunca mais teve o mesmo sabor desde que a realidade desses natais mudou, porque tivemos de crescer e criar a nossa própria família.
Mas então como podemos ou devemos celebrar a família depois da independência? O tempo passa e parece que andamos sempre a correr atrás dele, em défice contínuo. Como conseguimos reunir 20 pessoas a uma mesa num domingo, ao almoço, quando os nossos filhos têm futebol e catequese, nós precisamos de dormir e os nossos maridos precisam de usar aquele pouco tempo livre para a prática de exercício físico? Uns têm viagens marcadas, outros diferentes compromissos e parece ser impossível e encontrar o consenso para uma data. A questão é que temos de ser sinceros e admitir que a nossa relutância nada mais é do que o resultado das escolhas que fazemos. Cada um de nós deve saber o que é mais importante para si e que, por isso, é prioritário. Todos temos o mesmo tempo, o que muda são mesmo as escolhas e decisões que tomamos. Todos devemos saber o que é mais importante para nós e com quem ou com o quê queremos gastar o nosso tempo.
No meu caso, a prioridade são e serão sempre as pessoas, o convívio com elas e a aprendizagem contínua. Os lugares poderei sempre visitar. Já as pessoas não estarão sempre lá. Claro que podemos ter a sorte e privilégio de conviver e aprender com elas longos e bons anos, contudo, nenhum de nós sabe quanto tempo nos resta e quantas oportunidades de dizer amo-te podemos continuar a desperdiçar. Assim, defendo e defenderei sempre o almoço de domingo, o voltar a saborear as delícias gastronómicas da mãe, a gargalhada à mesa e o perceber que os sobrinhos cresceram e que já usam a ocasião para nos apresentar o/a namorado/a. A mesa é comprida e caso venha mais alguém será sempre bem-vindo, uma vez que é sempre possível colocar mais um prato na mesa, nem que isso signifique que teremos de comer um pouco mais apertados. As conversas paralelas multiplicam-se, a algazarra é uma constante, mas o amor é palpável mesmo quando se discute a justiça na marcação de um penalti no jogo do dia anterior. São horas em que o tempo parece que volta para trás e que nunca saímos daquela casa, ainda que agora a realidade seja paralela, uma vez que a família cresceu. Contam-se histórias do passado e desfolham-se os velhos álbuns de fotografias. Os mais novos percebem como a realidade atual é tão diferente daquela que foi vivida pelos seus pais quando tinham a sua idade, e os mais velhos facilmente constatam que não deveriam ter tido tanta pressa para crescer, que a sua infância e adolescência deveriam ter sido vivenciadas com mais calma e saboreadas mais devagar.
Seja como for, o pior vem depois quando toda a gente regressa às suas casas e a casa dos pais volta a ficar deserta. Uma casa tão grande, outrora barulhenta, num ápice fica silenciosa e expectante à espera do próximo domingo, momento em que se voltará a encher de vida. Apesar disso, e independentemente do número de domingos que optemos por passar com os nossos, o mais importante é que retiremos o máximo proveito desses momentos. Se estamos, estejamos em plenitude de corpo e de mente para que possamos absorver todas as belezas com que a vida nos presenteia. As belezas estão sempre lá, apenas temos de olhá-las com atenção e encará-las de coração e mente abertas, aceitando o que a vida tem de mais belo: as pessoas.
Por Armanda Bragança
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